domingo, 23 de novembro de 2014

Constatação

Anselm Feuerbach



E de repente te sinto, inteiro, como fosse uma possessão. Pressinto o teu desespero, teu temor insuportável, que por um instante torna-se meu temor insuportável.
E você insiste. Persegue minha sombra e a ela se funde, fazendo-me duvidar do que vejo.
Como piche, gruda-me na alma. Improvável de ser descolado, escurece-a, sufoca-a.
Aqui não há ar suficiente para nós dois. O oxigênio que resta apenas potencializa a combustão. Labaredas que consomem, marcam na pele cicatrizes horrorosas.
Já sabemos o final da história ainda antes do livro ser aberto. Porque a paixão é clichê, o egoísmo é intrínseco, a dor é pungente.
Quem sabe morremos. Quem sabe a libertação não venha no momento em que o corpo não tiver mais utilidade além da carcaça do que já foi, os prazeres tiverem definhado no frio do que talvez nunca tenha sido.
É uma pena que não seja. Uma pena que não tenha sido. Uma pena ter de morrer. Uma pena já ter morrido.

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