quarta-feira, 20 de junho de 2012

Calmaria


Claude Monet


Foi no lapso do tempo e espaço. Verão. A criança nasceu velha, incompreendida. Pai e mãe não teve, teve filhos. A família, pessoas emolduradas, um retrato na parede nua, decadente, sem sorrisos. O último que saiu, bateu a porta, deixou cair. Abandonado. No chão. Ficou lá. Tudo bem. Amigos teve, dois. Saídos como ela, do mesmo útero, da mesma dor, no mesmo retrato. Abatimento. Eles não vingaram como a menina. Sucumbiram ainda na flor da juventude. Mirrados de alma, sonhadores dos sonhos impossíveis. Doentes. Dementes seria palavra mais adequada. Porque o único prazer da menina era descobri-las: novas palavras velhas, todas elas descortinadas em novos contextos como tivessem acabado de nascer. Ela queria as mais difíceis, mais inalcançáveis se possível fosse. Vivia imagens forjadas. Ilusão. Tenha sido este seu elixir salvador. Nunca renasceu. Crescida, continuou velha, reclusa. Até que um dia foi ter com o mar, expressão maior do Divino. Com ele, conversou em silêncio, horas talvez dias. Às vezes fechava os olhos para saber a sensação que se tinha. Outra vez usou os próprios braços para proteger-se, alento gelado que vinha lá do oceano. O primeiro abraço. Foi bom. Sentiu-se viva como o mar, que fazendo curva no horizonte, se ia... Compreendeu. A crescida menina velha compreendeu tudo. Baixou a cabeça, sorriu para si. Despediu-se em silêncio. Um aceno de cabeça apenas. Gratidão.

2 comentários:

ProfessoraMGOO disse...

Para ser poeta, há que se ter o dom, parabéns, amei seu texto

Camila Veiga disse...

Obrigada! Fico feliz que tenha gostado. Sou apenas uma aprendiz. É um grande prazer tê-la como visitante!