segunda-feira, 4 de agosto de 2025

O livro e o continente

 



Estar com um livro na mão 

É sempre minha chance, um caminho

Uma nova versão 

De mim mesma

E conhecer meus obtusos,

Reconhecer meus intrusos, 

Convidados pelas frestas deixadas pelos medos meus

Do mundo. Assustador mundo que só existe

Porque antes o criei

Assim do jeitinho que ele se apresenta

Me abre, me entra

Meu palco, meu monólogo

Minha chatice cansada

Minhas ilusões, meu tudo e meu nada.

Meu parque de diversões, meu pronome possessivo

Lugar onde habito,

Onde eu e minha personagem se fundem, se perdem

Se inundam de dor e dúvidas 

E falta espaço, e sobra ausência.


Mas aí o livro na mão 

A respiração, minha derradeira chance

Sempre na iminência, sempre Alice

Em busca desse país, terra da maravilha

E deixar então essa ilha, para alcançar o continente

Esse lugar que acolhe e compreende 

E mora dentro de mim.


A vida é agora

 



Percebo que ainda nem nasci

E lá fora: O sol quente e lindo da manhã 

As correntes do balanço,

gritinhos animados, ouço e imagino a diversão 

Imagino a grama, o pega ladrão, a leveza

O céu, os lugares todos do mundo

Pessoas em vida plena

A poesia em cena


E eu em trabalho de parto

Nem trabalho

Nem parto

Só mente

Me mente


E eu crédula, nem feto, nem gente

Dedinhos à borda do oceano, gelado?

Quente, mas no ensaio do mergulho

Não sei, entende?


Só queria ser, só queria estar presente

Alguém que vive, olha, sente 

Escreve a palavra pela lindeza, 

A poesia em correnteza

Perene e livre


Mas se sou ainda represa

Que prende, amarra a saída 

Controla e mente

para mim mesma

Preciso do fórceps

Alguém, por favor, o fórceps?


É urgente! Preciso nascer

Ser simplesmente. E estar no palco

Nos bastidores, na plateia

Estar todinha, consciente

Esquecer as ciladas da mente


Só verso, somente.