Hovsep Pushman |
Clarisse me oprimia. Jeito de menear
a cabeça me dando de ombros, queixo em riste. Olhos atentos que me ignoravam na
intenção de me ignorar.
Clarisse me irritava, jeitinho de
fragilidade, cheia de mãos gesticuladas à exaustão, caras e bocas que não
revelavam palavras, apenas sombras de malícias num francês sustentado a muletas.
Clarisse me entristecia. Mania de
atropelar sentimentos, palavras, idades, meu cachorro. Eu nunca a perdoei por
isso.
Clarisse me dizia, se fazia, se gabava.
Boa moça, boa família, boa conta bancária. Boa vadia, eu completava em
pensamento.
Clarisse me descrevia. Gostava de
escrever. Dizia ter o dom das entrelinhas, nascido com ele. Piada! Enquanto no
papel difamava a mim mesma, a ela mesma, a nós. Identidade insuportável. Coincidência de reflexos, apenas isto. Um
espelho. Mas a farsante sempre foi ela.
Clarisse morria aos 27, porque
assim era mais justo, e tinha Bach como trilha sonora. Empréstimo meu. Foi a
mãe dela que pediu. Era seu último desejo. Meu maior desejo. Jesus Alegria dos
Homens, e minha também. Justifiquei minha ausência: ”É que velórios me causam
mal estar, uma espécie de pânico”. Simulei uma lágrima, a abracei convicta,
“Meus pêsames”.